FacebookLinkedin

Revista TecnoAlimentar

Tecnologias de secagem mista e obtenção de novas texturas em frutas

A utilização de tecnologias de secagem na transformação agroindustrial, aplicadas em particular aos hortofrutícolas, é um procedimento comum, antigo e útil do ponto de vista da conservação dos alimentos.

Secagem de fruta

Por: Renato Vaz, MSc, CFS, Consultor de I+D da NUVI FRUITS S.A.

A evolução do mercado agroindustrial, muitas vezes como resposta ao desenvolvimento de novas formas e tendências de consumo alimentar, abriu um novo objetivo à transformação, que vai muito para além da simples e bem estudada utilidade e necessidade de conservação, e que consiste na criação de novas texturas e sabores em produtos conhecidos ou mesmo numa vertente mais avançada da combinação entre tecnologia dos alimentos e marketing, na criação de novos produtos e novas tendências alimentares.

A NUVI FRUITS, em colaboração com parceiros internacionais (europeus e norte-americanos), tem vindo a desenvolver uma aplicação tecnológica que permitirá criar novas texturas, novas experiências de consumo e novos alimentos a partir de fruta.

Esta tecnologia combina a secagem convencional, a secagem por vácuo e a secagem por micro-ondas e aplica-se a qualquer tipo de fruta, conduzindo à eliminação gradual de água dos alimentos de forma natural e não forçada, de acordo com os princípios do processamento mínimo.

Para além das possibilidades infinitas ao nível da modificação do tecido das frutas submetidas a este processo, e que conduzem à já designada criação de novas experiências de consumo, a tecnologia de secagem mista permite proteger a cor, o sabor, o cheiro e a componente nutricional e dietéticas dos frutos.

O conhecimento das variáveis que definem este novo processo tecnológico combinado com a compreensão profundada fisiologia e estrutura dos frutos, permite definir e controlar os parâmetros de qualidade dos novos produtos.

Secagem - Origem e evolução

Do ponto de vista agroindustrial, a secagem é uma operação unitária que remove água de um alimento e é provavelmente uma das formas mais antigas de conservação de alimentos.

Um dos grandes motores de desenvolvimento das tecnologias de conservação de alimentos, em paralelo com o mercado e o consumidor, têm sido os conflitos armados, pelo que algumas das mais avançadas tecnologias de conservação têm origem em equipas de cientistas ligadas ao desenvolvimento de produtos para a indústria alimentar em cenários de guerra (Greensmith, 1998).

Do ponto de vista histórico, as diversas guerras e batalhas que decorreram na estratégica região da Crimeia desde os anos 53 a 56 do século XIX até à II Guerra mundial, foram uma alavanca para o desenvolvimento primário das tecnologias de secagem, dado o número de efetivos em confronto que se tornava necessário alimentar.

O crescimento populacional e os novos valores económicos, associados ao crescimento industrial, industrializaram a secagem e criaram unidades de transformação ainda hoje importantes do ponto de vista da alimentação humana. De uma forma massiva, fizeram chegar aos mercados produtos mais convenientes, de maior valor acrescentado, e que hoje são autênticas commodities, como é o caso dos grânulos de batata, da cebola desidratada, dos legumes desidratados, com as suas diversas utilizações em sopas, acompanhamentos e snacks, entre outras.

Da necessidade de comer à necessidade de comer com prazer, com segurança e com saúde, foi um salto, e a indústria alimentar encontra-se hoje num limiar permanente de mudanças e desafios, onde novas tendências formatam produtos e estratégias, tais como:

- A exigência por parte dos consumidores de alimentos que lhes permitam descobrir novos sabores, novas texturas, novos cheiros, novas combinações ou mesmo um regresso a memórias de produtos regionais, étnicos ou ancestrais (reposicionamento do palato);

- A inclusão na definição de alimentos saudáveis dos atributos frescura, autenticidade, suplementação nutricional, ou a ausência de substâncias indesejáveis (redefinição de saúde);

- A redescoberta do cozinhar em casa, em detrimento do consumo fora de casa, potenciada pela situação económica mas também pelo apelo à autocriação gastronómica, ou à necessidade de tornar as refeições momentos de descontração e de quebra de rotina (redescoberta da casa);

- A preocupação com a origem dos alimentos é outra tendência dos consumidores, que veem aqui uma garantia de qualidade e de afirmação de gostos próprios contra a globalização, que torna tudo igual, em favor da proximidade e da origem agrícola determinada (preocupação com a origem);

- Finalmente, uma das tendências alimentares mais marcantes dos últimos tempos: o snacking. Cerca de 20% dos novos produtos alimentares mais bem sucedidos são snacks e esta definição tem-se alargado para todas as pequenas porções de alimentos (snacking). (IFT, 2013)

Secagem - Processos convencionais e mistos

Os atributos sensoriais dos alimentos como o flavour, a cor, a forma e a textura continuam a ser os mais importantes e são transversais a todas as tendências e, apesar de serem todos, obviamente, subjetivos, são também mensuráveis e complexos.

De todos os atributos sensoriais, a textura é provavelmente aquele que envolve mais sentidos dado que abarca a visão, o gosto e o tato - e até a audição - sendo muitas vezes definida como um conjunto complexo de atributos mecânicos, geométricos e acústicos, entre outros (ASTM, 1992).

A secagem de um alimento, ao envolver fenómenos de transferência de massa e de energia, pode ser manipulada de forma a determinar a textura de um alimento, para além da previsibilidade física dos fenómenos que a condicionam, sendo isto possível através da utilização dos princípios da secagem mista.

Ao nível da transferência de energia, o tipo de energia utilizada é determinante do processo e dos parâmetros finais do produto a obter. A energia envolvida num determinado processo de secagem pode ter uma ou todas as seguintes origens:

- Convecção (onde a transferência de calor implica a movimentação da matéria);

- Condução (onde a transferência de calor se efetua sem movimentação da matéria);

- Radiação (onde a transferência de calor se efetua sem necessidade da existência de um meio material).

Por outro lado, a transferência de massa, em particular a água, tem formas de movimentação dentro dos alimentos muito diversas e intrincadas. Do ponto de vista da sua mobilidade, pode-se considerar livre, ligada (ou coloidal) e de constituição, dependendo das barreiras que enfrenta: água de difusão não restrita e água de difusão restrita (Vitadinni, 2007).

Nos processos de secagem convencional, o alimento é submetido a uma fonte de intensa de energia (calor), que normalmente não se adapta nem à sua composição e às restrições que essa composição colocam à sua mobilidade, nem à forma como a água se encontra ligada.

Desta forma, os produtos obtidos através de processos de secagem convencional apresentam, em maior ou menor extensão: a) uma degradação dos seus parâmetros sensoriais, como a cor, o sabor e o cheiro; b) uma obtenção casuística de texturas cujos parâmetros são diretamente dependentes da intensidade da energia aplicada durante o processo; c) um empobrecimento do seu valor nutricional.

Assim, devido à ocorrência de fenómenos extensos de degradação do alimento, os processos de secagem convencional apresentam pouca capacidade de adequação, quer às características específicas de diferentes alimentos, quer à preservação ou criação de novos alimentos. Em contraponto, os processos de secagem mista utilizam um conjunto de tecnologias que permitem obter um alimento com elevada retenção das qualidades sensoriais e nutricionais relativamente ao produto fresco.

Continua

Nota: Artigo publicado originalmente na Tecnoalimentar 2.

Solicite a nossa edição impressa

Contacte-nos a seguir dos seguintes endereços:

Telefone: 220 962 844

E-mail: info@booki.pt