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Revista TecnoAlimentar

Pescado

Carla Barbosa¹,²,⁴ e Manuel Rui Alves¹,²,³

¹ Centro de Investigação e Desenvolvimento em Sistemas Agroalimentares e Sustentabilidade, Instituto Politécnico de Viana do Castelo (CISAS – IPVC)

² Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto (LAQV-REQUIMTE-FMUP)

³ Diretor da Revista TecnoAlimentar

⁴ Subdiretora da Revista TecnoAlimentar

A União Europeia consume em média cerca de 27 kg per capita/ano de pescado e Portugal é o país que mais consome, sendo um dos maiores do mundo, com cerca de 57 kg per capita/ano. De uma forma geral, os produtos marinhos desempenham um papel importante na alimentação humana com reconhecidos efeitos na saúde. O consumo de peixe está associado a inúmeros benefícios nutricionais, sobretudo pelo aporte de ácidos gordos polinsaturados de cadeia longa ómega-3, de proteínas e pelo seu baixo teor em colesterol. Este reconhecimento promove o aumento da procura e em simultâneo uma maior exigência do consumidor relativamente à qualidade destes produtos, o que obriga à implementação de boas práticas associadas à produção.

A par disto, atualmente, são observadas evidências claras sobre a exaustão dos recursos marinhos, em muito devido às pressões demográficas crescentes, más práticas do retalho, alterações climatéricas, entre outras. Tal como o pescado fresco, os produtos transformados representam, atualmente, um importante peso na alimentação. A transformação permite não só o consumo em larga escala como também o transporte para zonas distantes do litoral. Os métodos mais comuns são a salga e a fumagem (mais ancestrais), a congelação, com vidragem e claro as tão populares conservas, tal como as conhecemos atualmente. A vertente deste setor que se dedica à transformação, tem em vista o aumento da sua competitividade, que depende sobretudo da adoção de práticas de aquacultura de precisão e o controlo e otimização dos processos produtivos, essenciais para garantir um produto final saudável e eficiente no que respeita à biodisponibilidade.

Uma das entidades que mais se tem esforçado para assegurar o equilíbrio do setor é a Docapesca – Portos e Lotas S.A., atualmente, tutelada pelo Ministério das Finanças e pelo Ministério do Mar. Numa perspetiva de valorização do pescado, a Docapesca, é um importante player deste setor, que reconhece a importância das boas práticas em todo o circuito do pescado, desde o barco ao prato, tendo tido uma colaboração ativa na elaboração de vários documentos orientadores. E, exemplo disso são os manuais de boas práticas utilizados pela grande maioria das embarcações de pesca que visam contribuir para uma maior valorização do seu pescado, garantido a qualidade desde a captura até à lota. Nesse contexto e alinhadas com as boas práticas para garantia da segurança alimentar, atualmente as frotas pesqueiras têm implementadas operações de refrigeração/congelação do pescado em alto mar, permitindo que as etapas seguintes de processamento ou distribuição ao retalho consigam que o produto chegue ao consumidor com a garantia da qualidade e segurança alimentar que este assim exige.

Para além da reconhecida importância do pescado como alimento, este tem despertado o interesse de investigadores sobretudo pela necessidade de garantir o escoamento de pescado excedente, a valorização de subprodutos e sua funcionalidade ao nível da inovação de produtos. Muitos destes resultados surgem no âmbito de projetos como o INOVEMAR e que são importantes para o crescimento sustentado da fileira. Espécies menos valorizadas capturadas, como por exemplo cavala, carapau, faneca, polvo e tainha, foram alvo de um estudo de I&D, quer pelo método de conservação, quer pela forma de apresentação. Por exemplo, a cavala e o carapau, devido ao seu elevado teor de gordura subcutânea, foram submetidos a um processo de fumagem em filetes e transformados em patés fumados em conserva, com diferentes molhos. Estes projetos visam também promover a interação entre clusters, mar e o agroalimentar, criando uma rede de empresas e entidades que procuram novas soluções.

Outros estudos tem mostrado o potencial bioativo e funcional de moléculas e compostos com origem marinha, com aplicação em diferentes produtos do setor agroindustrial, tais como: o encaminhamento de subprodutos para alimentação animal, para aplicação nos setores agrícola e ambiental; valorização destes compostos naturais pela farmacêutica; utilização de recursos marinhos como biomassa para a produção de biocombustíveis, etc. Vários programas financiadores (nacionais e europeus) têm viabilizado estes estudos, desde a modernização das embarcações (melhoria das condições de trabalho e a conservação do pescado), apoio ao investimento empresarial no setor aquícola e empresas de transformação com vista ao aumento da produção.

À semelhança do que acontece na maior parte dos produtos transformados é importante reforçar a necessidade de uma estratégia ambiental sustentável, sempre que possível recorrendo à circularidade sobretudo de resíduos e subprodutos. Tal como já se tem alertado em notas anteriores, é essencial a formação profissional para desenvolvimento de novas competências, o suporte de novos equipamentos e processos e uma relação estreita com o sistema científico e tecnológico.

Neste dossier dedicado à fileira do pescado dá-se destaque à valorização dos produtos e processos, abordando os riscos e benefícios do seu consumo. Na habitual entrevista a uma das empresas de referência do setor da transformação de pescado, estes temas são reforçados e referidos outros, como a importância da otimização das operações, sobretudo numa perspetiva da sustentabilidade ambiental e a importância da valorização dos seus colaboradores, proporcionando uma formação contínua e especializada.