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Revista TecnoAlimentar

O contexto das Massas Alimentícias

Por Carla Barbosa e Rui Alves

Massas alimentícias é uma designação portuguesa de um produto internacionalmente conhecido por “pasta”. Os ingredientes básicos usuais são farinha de trigo ou sêmola e água, sendo ainda alternativas a farinha de batata (usada em gnocci) e farinha de milho, em produtos sem glúten. Ingredientes adicionais incluem ovo, corantes naturais como por exemplo espinafre, tomate, azeitona entre outros ingredientes também nutricionalmente enriquecedores.

O processo produtivo inicia-se com a cuidada seleção e condicionamento da sêmola, mistura (principalmente com a água) e laminação já a temperaturas na ordem de 35-40 ºC, moldagem ou extrusão sob pressão elevada e por fim a secagem (a 90 ºC) até um teor de humidade de aproximadamente 14%. Após estas etapas as massas são armazenadas em silos ou embaladas de imediato. Ao longo das diferentes etapas, o aumento da temperatura deve ser controlado garantindo que não há degradação da estrutura proteica assim como o teor de humidade que é essencial para não ocorrer agregação. Trata-se de um produto simples e com poucos ingredientes, no entanto as etapas produtivas são, atualmente, altamente sofisticadas para garantir a qualidade do produto final, uma grande variedade de formas, tamanhos, cores e muito estável ao longo do tempo de vida útil.

A história diz-nos que a origem das massas alimentícias ou de uma espécie de massa seca, de farinha e água, se encontra atribuída a antigas civilizações, alguns séculos antes de Cristo, a grega, a estrusca e outros referem ainda a chinesa. A versão mais conhecida conta-nos que foi trazida para a Europa (Veneza) no século XIII por Marco Polo. Muito já foi escrito e discutido sobre as origens das massas. A especulação sobre a massa e a sua conceção incluem até histórias mitológicas romanas. No entanto, alguns autores chegam mesmo a constatar que a sua origem se deve à inteligência da humanidade que generalizadamente e de forma simples usou os ingredientes comuns, trigo moído ou outros cereais e água, quase universalmente disponíveis e que têm estado presentes desde o início da nossa história. No entanto, é a Itália que os ocidentais atribuem o desenvolvimento deste produto inicialmente muito simples até à diversidade dos dias de hoje.

No nosso país a produção de massas alimentícias encontra-se regulamentada pelo Decreto nº 45588 que remonta a 1964, publicada em Diário do Governo n.º 53/1964 (Série I) de 1964-03-03. Neste documento, define-se como massas alimentícias os produtos secos não fermentados, obtidos de sêmolas de trigo rijo de grão claro, ou de preferência de T. durum, e de água potável, por prensagem e subsequente secagem, com ou sem adição de outras substâncias legalmente autorizadas. Esta definição mantém-se atual e é transversal a muitos outros países.

Neste documento, a indústria encontra apoio para a tomada de decisões no que diz respeito aos aspetos mais relevantes da produção de massas alimentícias, desde a seleção das matérias-primas, as sêmolas ou farinhas, até ao desenvolvimento de produtos diferenciados e comercialização. As massas alimentícias classificam-se, quanto ao formato e composição. No que diz respeito ao formato, prevê-se três níveis: massinhas, massas curtas e massas longas onde se incluem as meadas.

Já no que diz respeito à composição, apesar de se agruparem de igual modo em três tipos, as massas comuns, especiais e dietéticas, a sua classificação é depois subdividida de acordo com as matérias-primas ou até micro ingredientes que integram a sua composição final.

No que diz respeito ao controlo da qualidade há aspetos relevantes a ter em consideração e que também são referidos na legislação, maioritariamente associadas a propriedades organoléticas. Por exemplo, as massas comuns obtidas de sêmolas de trigo rijo de grão claro, ou de preferência de T. durum, e água potável devem apresentar uma forma regular e bem definida, ser lisas ou macias ao tato e translucidas de tom âmbar. No entanto, as massinhas podem ser opacas e esbranquiçadas. Outros atributos importantes são a tipicidade do aroma, sabor não ácido na mastigação em cru, crocância seca, com fratura nítida, vitrosa e translúcida. Após cozedura, o volume do produto deve duplicar o apresentado no estado de cru, sendo o peso quase o dobro, incluído a água absorvida. Nas suas diferentes variantes, não deve deformar nem mesmo, no caso das formas tubulares, achatar ou tornar-se pastosa, bem como a própria água de cozedura. As massas longas deverão apresentar também certa elasticidade e resistência à quebra.

O setor produtivo das massas, atualmente, tem por trás uma indústria altamente sofisticada que utiliza tecnologias avançadas para maximizar a eficiência na produção e qualidade, muito pelo mérito dos técnicos que nela atuam. Conhecimentos de engenharia dedicados ao projeto das operações de extrusão e de secagem, esta última, essencial para que a qualidade do produto final seja garantida, bem como o domínio das ferramentas da qualidade para garantir que as etapas subsequentes promovam o eficiente acondicionamento (embalagem) evitando paragens na produção e o desperdício de produto.

Atualmente, existe um mercado crescente de ditas massas «frescas», ou seja, massas que não foram secas. No entanto, o baixo custo da massa seca para o retalhista e o consumidor tornam este produto de grande consumo, quando comparado com outros tipicamente usados como acompanhamentos ou pratos principais. O consumidor reconhece o valor acrescentado da “massa fresca” quando os produtos apresentam vantagens como a conveniência associados a qualidade e diversidade. Do ponto de vista do produtor há também interesse, pois neste caso o custo da secagem é muito reduzido e o produto comercializado contém mais água, traduzindo-se num rendimento significativamente maior. Não obstante da aparente vantagem no processo produtivo, trata-se de um produto com tempo de vida útil muito mais curto, com necessidade de maior empenho na sua formulação e armazenamento, para garantir a qualidade e segurança alimentar.

Não é possível falar de massas alimentícias sem abordar a matéria-prima principal: o trigo duro e respetiva sêmola. Tal como o seu nome diz, é essencial que seja de elevada firmeza, elevado teor de proteína entre outras, o glúten. As massas são produzidas muitas vezes recorrendo a farinhas de outras variedades de trigo, mas nunca se recomenda que ultrapasse os 25% correndo-se, mesmo assim, o risco de após cozedura comprometer-se a qualidade do alimento. As características físico-químicas das farinhas ou sêmolas são especificas (ex: teor de humidade, cinzas, entre outros) e devem ser respeitadas para garantir que o processo produtivo seja conduzido de acordo com as especificações do produto final e, no caso específico das massas secas não comprometer a aceitabilidade, após cozedura.

Mais, sendo o preço trigo duro uma referência nos mercados e apresentando um preço premium em relação a outros trigos, na conjuntura atual de subidas de preços abruptas e escassez de matéria-prima, é importante que as empresas apostem na autenticidade da matéria-prima. A adulteração no fornecimento desta matéria-prima e até mesmo na produção de massas com trigo comum ou mole poderá ocorrer.

Este dossier dedicado ao setor refere alguns estudos que constituem relevante fonte de informação para os seus diferentes intervenientes sobretudo no que diz respeito a estratégias e otimização de processos produtivos, adequar metodologias de controlo da qualidade e ainda desenvolver novos produtos alinhados com a imprescindível necessidade de poupar recursos energéticos e matérias-primas.

Sendo um bem de consumo em larga escala, é muito importante conseguir que a produção deste alimento seja económica e abundante, sem custos para a qualidade.

Leitura recomendada:

B.A. Marchylo, J.E. Dexter, Canadian Grain Commission, Winnipeg (2000). Pasta production. In G. Owens (Ed.), Cereals processing technology (pp. 120-141). CRC-Press, Woodhead Publishing Limited.

F. Lidon, M.M. Silvestre (Eds.) (2007). Indústrias Alimentares – Aditivos e Tecnologias. Escolar Editora.

R.C. Kill and K. Turnbull (Eds.) (2001). Pasta and Semolina Technology. Blackwell Science Ltd.

Nota de Redação

Entrevista publicada na edição n.º 31 da Revista TecnoAlimentar.

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