Reciclagem de óleos alimentares usados em Portugal cada vez estratégica graças a novas metas europeias na aviação
A rede portuguesa responsável pela reciclagem de óleos alimentares usados (OAU) e a economia circular do segmento poderão estar na antecâmara de um “ponto de viragem” que possibilitará, nos próximos anos, assistirmos a um “crescimento exponencial” nas quantidades recolhidas deste tipo de resíduos - que representa quase 70% da matéria-prima utilizada no fabrico de biocombustíveis – no nosso país.
E tamanha circunstância, além de significar boas notícias para o meio ambiente, dará uma “ajuda preciosa” não só rumo ao cumprimento das metas de neutralidade carbónica com que Portugal se comprometeu internacionalmente como poderá constituir “mais um passo relevante” para reduzir a dependência energética lusa das importações de combustíveis fósseis.
Quem o garante é o operador que gere o sistema de recolha, pré-tratamento e valorização de OAU que chega atualmente a mais de 140 municípios nacionais (com aproximadamente 2.850 oleões) e serve estruturalmente cerca de cinco milhões de portugueses, a Hardlevel – Energias Renováveis, pela voz do seu cofundador e administrador.
Na base da convicção de Salim Karmali está o recentíssimo acordo entre o Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia, no que respeita aos futuros rácios obrigatórios de incorporação de combustível sustentável de aviação (conhecido no domínio pela sigla SAF - Sustainable Aviation Fuel) nas rotas de transporte aéreo de passageiros e carga dos operadores aeronáuticos do espaço comunitário.
Segundo o acordo conhecido como “ReFuel EU”, e tornado público há dias, a cada cinco anos, e até 2050, Portugal e os restantes países-membros da União Europeia terão de garantir a incorporação progressiva de percentagens cada vez mais elevadas de SAF. Daqui a 27 anos, essa quota parte deverá ser de 70%, mas o primeiro degrau desse percurso começa já partir de 2025, quando 2% da totalidade das viagens dos operadores aeronáuticos da UE terão de ser movidos a combustível sustentável de aviação. O rácio terá de ser 6% em 2030, 20% em 2035, 34% em 2040 e 42% em 2045.
“É uma meta ambiciosa, que vem beneficiar todos, mas para a qual, e na parte que toca a Portugal, os decisores políticos terão de dedicar mais atenção. Desde já, para garantir o cumprimento da legislação em vigor, bem como mais medidas e ações concretas, inclusive ao nível de uma sensibilização crescente junto da população. Os portugueses estão cada vez mais a descartar convenientemente os óleos alimentares usados – a matéria-prima mais usada na produção dos ‘combustíveis verdes’ -, mas há ainda muita margem de progressão neste particular, principalmente nos resíduos domésticos”, salienta Salim Karmali, que criou a Hardlevel em 2006, juntamente com o seu irmão Karim Karmali, no âmbito de um programa de apoio ao empreendedorismo português.
Só nos últimos oito anos, a Hardlevel conseguiu poupar a atmosfera ao efeito estufa de 1.139.536 toneladas de dióxido de carbono (CO2). Por causa da simples entrada dos óleos alimentares usados (limpos de impurezas, metais pesados e outros contaminantes) no circuito produtivo dos combustíveis verdes, com um índice baixíssimo de emissão de gases de efeito estufa (GEE).
Mil litros de OAU permitem produzir até 980 litros de biodiesel, um combustível mais ecológico, com um índice de emissão de dióxido de carbono que pode ser 80 por cento inferior aos emitido por uma viatura movida a gasóleo, por exemplo.
Na atualidade, a Hardlevel possui uma capacidade instalada de pré-tratamento e valorização de 50.000 toneladas anuais de OAU e 4.500 metros cúbicos de armazenagem instantânea, nos polos operacionais de Avanca e Palmela.
A empresa – que está a internacionalizar o modelo em diversas municipalidades de Espanha e França - pretende chegar deste ano com uma rede de 165 autarquias parceiras e um global de 3.300 oleões espalhados pelo País. O que, relativamente a 2022, reflete expansão de 18% no número de concelhos abrangidos e de 16% no total de unidades de descarte de óleos usados.