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Revista TecnoAlimentar

Recomendações para a conservação dos alimentos pelo frio

O uso do frio para a conservação dos alimentos é um processo antigo que permite retardar ou inibir o crescimento da atividade dos microrganismos e retardar as reações químicas. Processos de refrigeração, com temperaturas acima do ponto de congelação, são usados para conservar os alimentos por dias ou semanas; e processos com temperaturas abaixo da congelação são usados para conservar os alimentos por maiores períodos de tempo, podendo alcançar meses ou anos.

Conservação pescado

Por: António Santos, Engenheiro Mecânico Térmico

Entende-se como produto refrigerado aquele que sofre um arrefecimento sem atingir a congelação; e um congelado aquele que congela toda a água contida a uma temperatura de -10ºC, e é mantido a essa temperatura até ser entregue ao consumidor. O produto ultracongelado é aquele que depois de ultrapassar rapidamente a zona de cristalização máxima, atinge -18ºC (pode ir fortemente a -25, -30ºC) em todos os seus pontos e até entrega ao consumidor (NP EN 1524).

O conhecimento das condições gerais de temperatura aplicadas a cada processo desde a captura ao local de armazenamento e venda, é de interesse ao dimensionamento das máquinas produtoras de frio. Neste artigo apresenta-se de forma resumida alguns métodos e condições para a conservação pelo frio para pescado, carne, frutas e verduras.

Pescado e produtos de pesca

A conservação em fresco do pescado tem o início nos barcos de pesca e vai até aos estabelecimentos de venda ao público.

Nos barcos, o pescado deve ser mantido a uma temperatura próxima da do gelo fundente. A cobertura com gelo é uma técnica usada para baixar e manter a temperatura em 1ºC até à sua chegada ao cais. Quando a conservação é feita em água do mar limpa refrigerada, os barcos devem estar equipados com cisternas com sistemas de arrefecimento. Estes devem ter a capacidade de reduzir a temperatura da mistura (água, pescado), para 3ºC no máximo em 6 horas após o enchimento, e para 0ºC no máximo em 16 horas, com controlo e registo da temperatura.

Nas lotas devem ser usadas medidas para evitar o aumento da temperatura do pescado. Por exemplo, a lavagem com água a temperaturas de 3ºC, e o uso de gelo moído durante a venda podem ser usadas. Depois da venda o peixe deve ser gelado, e transportado ou armazenado em câmaras com temperaturas de 2ºC e humidades relativas de 90%. Estas condições permitem manter uma ligeira fusão do gelo evitando a sua desidratação, e garantem a temperatura do produto entre 0 e 1ºC. O pescado magro com as condições anteriores conserva-se em bom estado durante cerca de oito dias e o gordo em cinco dias.

Nos estabelecimentos de venda a retalho o pescado deve ser colocado em câmaras, vitrinas, ou balcões com temperaturas o mais próximo dos 0ºC, mas sempre com gelo.

A congelação dos produtos da pesca é um processo que pode ser iniciado também no interior dos barcos ou em terra. Os navios congeladores e os navios fábrica devem estar equipados com máquinas de congelação com potências suficientes para reduzir rapidamente a temperatura interna dos produtos a valores não superiores a -18ºC, e para os manter à mesma temperatura nos porões de armazenamento.

Os peixes gordos e os moluscos a -18ºC conservam-se por cerca de 4 meses, os crustáceos aumentam a sua duração em mais 2 meses, e os peixes magros aumentam para o dobro. A congelação do pescado pode ser feita por correntes de ar frio, por contacto com placas metálicas arrefecidas ou por salmoura. No caso do ar frio o pescado é sujeito a correntes de ar com velocidades de 3 a 5 m/s e com temperaturas mais baixas que o produto (exemplo -35ºC).

Na congelação por placas, os produtos ficam sujeitos à perda do calor entre a superfície do produto e umas placas metálicas arrefecidas também a baixas temperaturas (exemplo -35ºC). A congelação por salmoura é aconselhada para peixes inteiros, e pode ser feita por imersão do pescado no interior da salmoura contida em recipientes, ou pela pulverização fina da solução em câmaras com o pescado suspenso ou acondicionado em caixas. Quando o pescado congelado por salmoura é destinado ao fabrico de conservas, a sua temperatura pode ser mantida a um valor não superior a -9ºC.

Durante o transporte, os produtos congelados, com exceção do peixe para a conserva congelado em salmoura, devem ser mantidos a uma temperatura não superior a -18ºC com aumentos máximos tolerados de 3ºC. No interior dos móveis de frio de venda, o pescado deve manter como limite superior de temperatura os mesmos -18ºC, por meio da circulação de uma baixa corrente de ar frio (exemplo -25ºC) e de uma alta humidade (exemplo 90%).

Carne e derivados

A cadeia de frio da carne vai desde os centros de abate (matadouros) até aos supermercados.

Os animais de casco domésticos após o abate e inspeção devem ser submetidos a uma operação de refrigeração no próprio matadouro que garanta uma temperatura uniforme não superior a 3ºC para as miudezas, e 7ºC na restante carne.

Estes valores de temperatura devem ser mantidos durante as operações de desmancha, desossa, aparagem, corte e embalagem, em salas de trabalho com temperaturas ambiente de 12ºC. Se a sala se encontrar no mesmo local do abate, as operações anteriores podem ser feitas antes de alcançar as temperaturas referidas. As células ou túneis de arrefecimento rápido a ar, com temperaturas de -1 a 0ºC e humidade de 90 a 95%, são os equipamentos normalmente usados no arrefecimento.

Durante o transporte os valores de temperatura anteriores, quer da carne como os ambientais, devem ser assegurados, sendo admitido um aumento na sua temperatura de 1ºC desde a saída até à chegada ao destino.

Nas câmaras de conservação de frescos devem ser mantidos os mesmos valores de temperatura e humidade que os túneis de arrefecimento rápido. Isto permite garantir uma duração máxima aproximada em bom estado de 4 semanas para a vaca e 2 semanas para o porco e borrego. O ar interior das câmaras industriais deve ser renovado 1 vez por dia, por ar novo isento de cheiros, e tratado às mesmas condições de temperatura e humidade interior.

As câmaras e móveis de frio para a conservação da carne fresca nos estabelecimentos de venda devem manter uma temperatura do ar entre 0 e 2ºC e uma alta humidade relativa (exemplo 95%).

A congelação da carne deve ser feita pela redução da temperatura no seu centro térmico a valores menores ou iguais a -10ºC em períodos máximos de 24 horas. O processo de congelação é completado com a redução da temperatura para os -18ºC (valor prático comercial) nas 24 horas seguintes. Este valor de temperatura permite manter a carne bovina em bom estado durante cerca de 12 meses, o borrego 9 meses e o porco 6 meses. Os túneis a ar com as mesmas condições de velocidade e temperatura do ar que anteriormente referido no pescado podem ser usados para a congelação da carne.

Durante o transporte tolera-se um aumento da temperatura entre a carga e a descarga de 3ºC, sendo aconselhado uma temperatura inicial de carga igual à final da congelação.

Nos móveis de frio para venda, a carne congelada deve ficar sujeita à circulação do ar com condições que garantam os -18ºC. Por exemplo -25ºC de temperatura do ar e 90% de humidade relativa são valores que podem ser usados.

As aves, após a inspeção e evisceração devem ser limpas e refrigeradas até uma temperatura não superior a 4ºC, usando o ar frio ou a imersão. As operações convencionais do talhante devem ser feitas em salas de trabalho com 12ºC, e a sua conservação em refrigerado em câmaras com temperatura e humidade semelhantes aos animais de casco. O ar interior deve ser renovado, por ar novo tratado 2 vezes por dia. A congelação das aves é feita normalmente em túneis a ar ou por contacto até alcançar os -18ºC no centro térmico, que devem ser mantidos nas câmaras de conservação de congelados.

Frutas e verduras

Os métodos de tratamento pelo frio aplicados aos hortofrutícolas só têm o seu efeito positivo se os produtos forem sãos e limpos. A refrigeração normal e a congelação são dois dos métodos usados na conservação destes alimentos. A refrigeração normal, por sua vez, é composta por um arrefecimento rápido do produto após a sua colheita, ou também chamada de fase de pré-arrefecimento, e pela fase de conservação convencional em câmaras.

Para a fase inicial de arrefecimento rápido são usados métodos por ar frio, por água fria, por contacto com gelo, e por evaporação de água. No método de ar frio o produto pode ser simplesmente colocado numa câmara convencional a ar sujeito ao arrefecimento normal, ou ser disposto em filas e tapado com cobertura própria, com ventiladores locais de forma a circular o ar pelo produto. A primeira situação origina maiores tempos de arrefecimento que a segunda, e conduz a uma maior desidratação do produto, não sendo aconselhada para produtos muito perecíveis.

O uso da água fria, ou hidroarrefecimento, é um processo mais rápido que o anterior a ar, e pode ser feito por chuva de água fria ou por imersão. No primeiro caso a água cai por gravidade para uma bandeja perfurada, que a distribui sobre o produto que circula sobre uma cinta transportadora. No segundo caso o produto é imerso no fluido líquido frio, que está no interior de um tanque de grande capacidade com um agitador. Os produtos são carregados numa das extremidades de uma cinta transportadora e viajam ao longo do tanque até ao extremo oposto. A velocidade de circulação da água anda entre 75 a 100 mm/s com uma temperatura de 1º C.

O contacto com o gelo é um método antigo, e consiste em colocar uma camada de gelo antes do fecho da embalagem, que vai derretendo e escorrendo, arrefecendo o produto. Apesar de ser um arrefecimento mais rápido que o ar, está limitado aos produtos que permitem o contacto com o gelo.

O método de evaporação de água pode ser simples ou em vácuo. O simples, adequado para climas secos, com ar a humidades relativas baixas (aproximadamente ≤ 65%), tira partido da evaporação da água para absorver o calor dos produtos a um valor de pressão atmosférica normal. No sistema de vácuo, os produtos são expostos em contentores, onde é feito vácuo a valores de 4.5 a 7 mmHg, permitindo a vaporização da água a baixas temperaturas, absorvendo o calor do produto.

Este sistema permite arrefecer mais rapidamente os produtos, tendo o inconveniente da perda de água (exemplo 1% de peso por cada 5ºC), que é ultrapassado nos sistemas modernos pelo uso de aspersores internos, que entram em funcionamento sempre que existe uma perda de peso. Para uma conservação prática das frutas e legumes em câmaras de refrigerados, estes devem ser organizados por espécies de condições de temperatura e humidade semelhantes.

Nota: Artigo publicado originalmente na Tecnoalimentar 5

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