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Revista TecnoAlimentar

Nutre: Leite e Soja nunca estiveram tão perto

entrevista

Na Zona Industrial de Vagos nasceu um novo conceito inteiramente português: produzir uma bebida de soja com um sabor igual ao do leite de vaca. Com os resultados que a empresa atingiu com tão pouco tempo de existên­cia, detendo 70% da quota de mercado das bebidas de soja em pouco mais de 15 meses, parece que não podia ter escolhido um melhor caminho.

Apostar no mercado dos intolerantes à lactose, ao glúten, ou outros alergéni­cos, bem como nos consumidores que procuram um estilo de vida mais saudá­vel, tem sido uma aposta ganha da Nu­tre. Em muito pouco tempo conquista­ram o mercado nacional da distribuição, a nova marca Shoyce (com 7 meses de existência) já faz parte do quotidiano de algumas famílias portuguesas e a empresa começará a exportar no mês de maio para 2 continentes diferentes. Recentemente, foi eleito o Produto do Ano 2015.

TecnoAlimentar: A Nutre é uma multinacional de origem portu­guesa. Produz a soja na Roménia e tem a sua fábrica em Portugal. Co­mercialmente onde está presente?

João Vítor: A Nutre está atualmente presente em Portugal e Espanha com bebidas vegetais de soja. Em abril e maio de 2015 entrará com a sua mar­ca Shoyce em Taiwan, China e Hong Kong.

Relativamente aos planos de expansão a marca Shoyce continua a procurar novos importadores e distribuidores em alguns mercados internacionais. Já decorrem negociações para entrada a curto prazo da Shoyce na Nigéria, Finlândia, Israel e Turquia. Acreditamos que podemos ser genuinamente portugueses e triunfar lá fora.

 TA: Quais os cereais e oleaginosas utilizados pela Nutre e quais os seus fins específicos?

JV: Uma das nossas grandes apostas é a utilização da soja. Fonte proteica rica em aminoácidos essenciais. A soja não con­tém colesterol e apresenta uma quantida­de mínima de ácidos gordos saturados, ao contrário da carne e de outros produtos de origem animal. A soja gera cada vez mais interesse no campo das doenças car­diovasculares, demonstrando benefícios na sua prevenção, devido ao elevado teor em ácidos gordos poli-insaturados, vita­minas, minerais, fibras e a um reduzido teor em gorduras saturadas.

Três estudos médicos publicados no American Journal of Clinical Nutrition, em 2012, concluíram que as mulheres subme­tidas a tratamentos para o cancro da mama que consumiam regularmente produtos à base de soja, apresentavam uma redução de 25% na probabilidade de nova ocor­rência deste tipo de cancro. Outro estudo recente, publicado no Asian Pacific Journal of Tropical Medicine, demonstrou que o con­sumo de isoflavonas de soja tem efeitos no aumento da densidade óssea, ajudando a prevenir e a tratar a osteoporose. Tendo em conta todos os benefícios associados ao consumo da soja, a nossa opção só poderia ser por este produto.

TA: Qual a capacidade produtiva da Nutre?

JV: A capacidade produtiva por ano da unidade de Vagos é de 40 milhões de litros de bebidas de soja; 45 milhões de barras de cereais e 10 milhões de sobre­mesas de soja.

TA: A Nutre apresenta a inovação e desenvolvimento como pilares estratégicos. Em que medida esta aposta já se traduziu em retorno/ resultados? Quais os melhores exemplos disso mesmo?

JV: Uma das grandes apostas da Nutre desde a primeira hora foi a criação e o desenvolvimento de um produto inova­dor face à oferta existente no mercado. Este trabalho foi de tal forma importante que nos permitiu colocar no mercado o único produto que tem o sabor e o perfil nutricional mais próximo do leite. Algo que até agora não estava à disposição dos consumidores. Este é o resultado de um processo realizado, ao longo de mais de 14 meses, pela equipa de investigação e desenvolvimento da Nutre que culminou com início da sua comercialização, no fi­nal de 2014. Shoyce é o nome da nossa linha de bebidas de soja e é uma aposta inédita em Portugal, pela origem não transgénica dos grãos e pela produção nacional. A quantidade de proteína da Shoyce é equivalente à presente no leite o que representa cerca de mais 15% das bebidas de soja existentes, tornando-a numa bebida nutricionalmente mais rica e com maior poder de saciar as necessida­des de reposição de alimento ao organis­mo.

Em termos vitamínicos, e para além da vitamina B12, também presente no leite, a Shoyce contém ainda as vitaminas A e D. A vitamina B12 é essencial para o funcionamento normal do cérebro, do sistema nervoso e para a formação dos glóbulos vermelhos. Está relacionada com o metabolismo das células do corpo hu­mano contribuindo para a elaboração do ADN.  A vitamina A é importante para a pele e mucosas bem como para a visão. Já a vitamina D favorece a absorção do cálcio, sendo importante também para fortalecer os ossos e os dentes, além de evitar o raquitismo. A Shoyce contém a mesma quantidade de cálcio que se pode encontrar no leite mantendo-se, assim, a capacidade fortificadora e regeneradora da massa óssea essencial para prevenir a osteoporose. Com uma produção 100% vegetal, estas bebidas surgem como uma relevante fonte de fibra e estão excluídos o colesterol e a lactose. O glúten não está, igualmente, contemplado na composição dos produtos Shoyce e verifica-se uma redução de 45% no conteúdo de açúcar, quando comparado com o do leite.

TA: Porquê a marca Shoyce?

JV: A soja é um alimento extremamen­te saudável e uma ótima fonte de pro­teína vegetal. Percebemos também, por outro lado, que o mundo continua a preferir o leite. Consome-se por exem­plo em Portugal cerca de 25 vezes mais leite do que a bebida de soja. Se olhar­mos para os asiáticos estes, apesar de não consumirem leite devido à enorme percentagem de intolerantes à lactose, querem consumir leite. Isto significa que: existe uma lacuna de bebidas ve­getais próximas do leite; o consumidor disse-nos que, embora reconheça os benefícios da bebida de soja, não gosta propriamente do sabor da soja. Existe uma parte de consumidores (os apre­ciadores de soja) que apreciam o sabor da soja, mas a grande maioria gosta é do sabor do leite, pois é o sabor que está habituado, então a Shoyce pro­põem-se oferecer a proposta alimen­tar mais próxima do leite, em toda a perspetiva. Se o consumidor que leite, procura leite, está habituado ao seu sa­bor e á sua textura, tem o hábito cul­tural de o consumir, então é isso o que vamos oferecer.

A Shoyce é a bebida vegetal mais próxima do leite. Porquê? Sabor, cálcio, vitaminas, proteínas. A diferença está na proteína ser de ori­gem vegetal em detrimento da animal, nas vitaminas, para além da B12, que é a oferta do leite comum, temos tam­bém a A e a D12, não temos lactose e temos menos açúcar, ou seja, a Shoyce diz aos consumidores de soja que ago­ra tem mais uma opção no mercado e diz aos consumidores de leite que nós somos a bebida mais próxima possível do leite que ele irá encontrar em todo o mundo. Neste momento, a Shoyce é um produto único no mundo.

Excetuando o mercado asiático, a soja sempre foi vista como uma al­ternativa ao leite, ou seja, as pessoas começaram a consumir soja porque eram intorantes à lactose, glúten, por­que procuravam um estilo de vida mais saudável ou também, em alguns casos, porque apreciavam a bebida. Mas no geral a procura pela soja tinha como base razões terapêuticas ou de saúde e não de sabor. Então nós quisemos que­brar o mito de não ser possível consu­mir algo saudável e bom, e juntámos o tasty ao healthy. E Shoyce representa isso. A partir de agora, os consumido­res têm opção, até pelo preço, pois nós somos reconhecidamente mais baratos do que outras ofertas disponíveis no mercado.

TA: A Nutre tem a fórmula patente­ada ou optou por não o fazer para não a tornar pública?

JV: Temos a fórmula, é secreta e só nossa, não a registámos para não a tornar pú­blica e passível de ser copiada. Temos de fazer o nosso caminho sendo os primeiros.

TA: A Nutre começou a sua produ­ção em 2013, porém a marca Shoy­ce apenas aparece em outubro de 2014. A venda para marcas de dis­tribuição (MDD) no início foi uma aposta ganha?

JV: Sim, sem dúvida. Estamos, neste mo­mento, com cerca de 70% do mercado das MDD em Portugal. Resumidamen­te, isto aconteceu por várias razões: pelo facto de sermos a primeira fábrica de pro­dução de bebida de soja em Portugal, à elevada qualidade do produto e à redução do preço do produto ao consumidor final.

TA: E, desde que entrou no merca­do em 2013, o consumo de bebida de soja aumentou em Portugal?

JV: Cresceu 2 milhões de litros. Antes da Nutre chegar, o mercado português ven­dia 16 milhões de litros e vende agora 18 milhões de litros/ano. É um crescimento a dois dígitos. Mas, para se ter uma noção, o mercado de leite vendeu 500 milhões de litros, o que traduz bem o potencial de crescimento da bebida de soja no merca­do nacional.

Somos o único produtor de bebida de soja português, até a Nutre entrar no mer­cado, apenas existiam produtos importa­dos. Temos muito orgulho nesse facto e acreditamos estar a contribuir significati­vamente para a economia nacional. Ima­gine o défice comercial neste segmento antes da chegada da Nutre, onde tudo era importado. Neste momento, para além de termos a maior quota do mercado nacio­nal, já estamos a exportar.

TA: Quanto representou o investi­mento?

JV: O investimento representou 13 mi­lhões de euros. Investimos em laborató­rios e linhas de produção muito evoluídas. Pensamos desde o início construir uma marca de Portugal para o mundo. Querí­amos uma marca orgulhosamente portu­guesa mas que fosse rapidamente expor­tável. Iniciámos obviamente em Portugal, onde já estamos em todas as maiores ca­deias de distribuição.

TA: Sente que existiu hostilidade ou resiliência relativamente à en­trada de um produto de bebida de soja, sendo concorrente da podero­sa indústria de latícinios?

JV: Não, penso que são categorias dife­rentes. Sentimos é, desde o primeiro dia, um carinho inacreditável por parte dos consumidores.

TA: As vendas superaram as expec­tativas?

JV: Existem dois pontos na sua questão: em termos de distribuição, está a exceder as nossas expectativas. O que ainda não houve foi total correspondência em che­gar ao consumidor. O produto tem che­gado rapidamente ao linear, as pessoas vão provando e, quando estão em contac­to com a nossa marca, voltam a repetir. Porém, não tem sido tão rápido quanto queríamos, mas as vendas nunca são tão rápidas quanto nós gostaríamos (risos). Mas é algo que mensalmente cresce a dois dígitos e, portanto, tudo o que cres­ce a dois dígitos não podemos dizer que é mau. Mas, respondendo à sua pergunta, sim, acreditamos muito na Shoyce e sabe­mos que será um sucesso, não apenas em Portugal mas no mundo.

TA: O facto de as vendas não esta­rem a corresponder às expectativas poderá dever-se ao tempo de vida muito curto da mesma e, por isso, existir um período de “infiltração” da marca no quotidiano do consu­midor. O que a Nutre tem planeado para chegar mais perto do consu­midor?

JV: Está tudo a acontecer muito rápido. O website não tem ainda um mês, a pági­na de facebook tem 3 meses, contratamos uma empresa de assessoria de imprensa este mês. A comunicação estamos agora a começar a fazer... estamos agora a es­tabelecer parcerias com entidades para promover o consumo e utilização dos pro­dutos Shoyce, não só o consumo do leite de soja puro mas também a sua utilização para receitas mais saudáveis. Iremos tam­bém começar a comunicar em massa em pouco tempo.

TA: A Nutre posiciona-se como uma empresa portuguesa que trabalha com cereais não transgénicos. Por­quê esta opção? De que forma esta representa um custo? O mercado consumidor valoriza este facto?

JV: Os consumidores felizmente estão hoje cada vez mais informados e fazem cada vez mais compras conscientes. E a questão dos cereais alterados genetica­mente, fruto também da cobertura noti­ciosa que estes temas têm tido um pouco por todo o mundo, é um assunto cada vez mais na ordem do dia e que está na men­te e nas preocupações dos consumidores. Todos os nossos produtos são Non GMO Non Genetically Modified Organisms - e essa in­formação está disponível e em local visível nas nossas embalagens. Para nós é não só um selo que atesta a qualidade dos nossos produtos, mas também atesta o respeito que temos pelo meio ambiente e pela saú­de dos nossos clientes.

TA: Como é feito o rastreamento da soja e dos outros cereais?

JV: Para garantir a integridade da compo­sição nutricional dos grãos de soja, estes são cultivados e colhidos por agricultores sem recurso a organismos geneticamente modificados. Chegados à fábrica, os grãos são limpos e selecionados. É retirada a casca aos melhores grãos, que são moí­dos e, seguidamente, cozidos. A cozedura permite que se destruam as toxinas natu­rais da soja. Ao líquido resultante deste processo, são adicionados os diferentes ingredientes da bebida de soja, que pas­sa, depois, por rigorosos controlos de qua­lidade, antes de ser embalada. Uma das mais-valias da Nutre é o facto de contro­lar todo o processo desde o cultivo da soja até à colocação do produto no mercado, o que de facto nos permite garantir a efetiva qualidade dos nossos produtos. Este pro­cesso é igualmente extensível aos restantes cereais que utilizamos em todo o processo produtivo.

TA: A contratação de mão de obra altamente qualificada é uma apos­ta da Nutre? Quais as principais áreas de conhecimento dos colabo­radores da empresa?

JV: Foram criados até 2014, cerca de 40 postos de trabalho, muitos destes altamen­te qualificados.

TA: Estão a considerar a entrada em novos mercados brevemente? E produtos?

JV: A nossa equipa de I&D está constan­temente a desenvolver novos produtos e novas soluções para disponibilizar ao mercado. A oferta Shoyce surge em 5 op­ções: quatro bebidas e um complemento culinário: Original, Light, Chocolate e Baunilha. Temos também as barras de cereais. Até ao final do primeiro semestre, alargaremos o nosso portefólio de produ­tos. Estamos a finalizar uma linha para crianças que está a ser desenvolvida em parceria com uma outra empresa de re­ferência na alimentação saudável. Temos também alguns produtos já finalizados a nível de I&D mas que ainda não foram lançados no mercado por algumas razões, consideramos que devemos ir “doseando” a inovação.

Em relação aos mercados, temos vindo a fazer uma aproximação aos mercados que consideramos prioritários quer pela sua dimensão, quer pelo seu potencial de consumo no que se refere à soja. Este é um processo que tem cerca de 1 ano. Temos vindo paulatinamente a alargar a nossa presença internacional. Em abril e maio chegaremos a Espanha, China e Taiwan, mas a ambição da Nutre não fica por aqui e decorre já trabalho no terreno para chegar ainda este ano a países como a Finlândia, Turquia, Israel e Nigéria. É ambição da Nutre Indústrias Alimentares estar presente em 10 mercados até ao final de 2015. Estamos com uma forte aposta no mercado espanhol. Espanha consome cerca de 165 milhões de litros de bebidas de soja por ano. Como dado comparativo, o consumo anual de bebidas de soja em Portugal ronda os 18 milhões de litros. No entanto, a Nutre tem os olhos simultanea­mente focados noutras regiões igualmente promissoras. Pretendemos desenvolver a aposta no continente asiático. Para além dos grandes mercados, como a China, os países do sudeste da Ásia demonstram-se particularmente aliciantes. Este interes­se no continente asiático fundamenta-se no já massificado hábito de consumo de produtos alimentares à base de soja e na percentagem média de indivíduos que de­monstram intolerância à lactose, naquela região – 90 a 100% da população. As pre­visões apontam para que o mercado de consumo de soja até 2015 seja de 19.2 mil milhões de litros em todo o mundo.

TA: Finlândia, Turquia, Espanha, Nigéria, Israel...Porquê a aposta em países tão distintos geográfica e culturalmente?

JV: Por várias razões. Os países nórdicos são atrativos pois são importadores e recetivos a produtos inovado­res. O mercado asiático porque é o mercado da soja. Os países deste continente são os maiores consumidores de soja a nível absoluto e, como tal, não a poderíamos deixar fora do mercado. No caso da Ni­géria, chegamos a pensar em vários países, mas a Nigéria é a maior economia em África, com um grande potencial de crescimento nos próximos anos. Quando se efetua um processo de internacionali­zação, faz-se normalmente um “misto”, abordando mercados mais maduros, outros mais jovens...

TA: E como é feita a abordagem aos mercados interna­cionais?

JV: Através de um importador local, que nos compra o produto e nos representa na negociação com os distribuidores, sempre em arti­culação connosco. Escolhemos este modelo pela maior facilidade de penetração nos mercados, pela capacidade de resposta imediata que os nossos representantes poderão dar nos países de destino, pela ne­cessidade de realização de campanhas de marketing e comunicação. O distribuidor tem que sentir a marca Shoyce!

TA: Qual a distribuição das vendas por produto e região?

JV: Em Portugal, a distribuição das bebidas de soja Shoyce tem evoluído de forma rápida e as vendas têm vindo a crescer susten­tadamente, a Nutre espera fechar o ano de 2015 com cerca de 10.000.000€ de faturação. A bebida de soja com sabor a chocolate tem-nos surpreendido bastante pela positiva, mas as vendas têm-se distribuído homogeneamente.

TA: E já pensam em novos produtos?

JV: Neste momento estamos em fase de alargamento de gama, em breve estará disponível o sabor a baunilha. Vamos também fazer uma oferta na linha “Crescimento”, direcionada para as crianças, e em pouco tempo lançaremos a bebida vegetal de arroz, e tam­bém de arroz com sabor a chocolate.

Por: João Duarte Barbosa, in TecnoAlimentar nº 3