Clima altera distribuição de atuns no Atlântico

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Estudo revela que as alterações climáticas poderão provocar a expansão das principais espécies de atum para latitudes mais elevadas, com impactos potenciais na biodiversidade marinha e na gestão sustentável das pescas
Um estudo publicado na revista Biodiversity and Conservation e liderado por investigadores do MARE – Centro de Ciências do Mar e do Ambiente, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (CIÊNCIAS ULisboa), em colaboração com o CESAM e o Instituto de Investigaciones Marinas (CSIC, Espanha), projeta mudanças significativas na distribuição das principais espécies de atum capturadas no Oceano Atlântico, em resposta às alterações climáticas
Em 2022, as capturas mundiais de atuns ultrapassaram os 8,3 milhões de toneladas, o valor mais alto alguma vez registado, com as principais espécies comerciais a representarem cerca de 60 % dessa produção. Para além do seu valor económico e importância na alimentação humana, os atuns desempenham também um papel ecológico fundamental como predadores e presas nos ecossistemas oceânicos.
Conforme explica a faculdade em comunicado, a equipa científica recorreu a ferramentas de modelação ecológica para prever como as condições ambientais poderão afetar as áreas onde o atum poderá viver no futuro. O estudo analisou três cenários possíveis de evolução do clima até ao final do século: um cenário otimista com aumento da temperatura média global de cerca de +2?°C; um cenário intermédio com aumentos entre +3,5?°C e +4?°C; e um cenário severo em que a temperatura poderá subir mais de +5?°C. As projeções consideraram dois períodos futuros: 2020–2030 e 2040–2050, centrando-se em cinco espécies de atum: Thunnus alalunga, T. thynnus, T. albacares, T. obesus e Katsuwonus pelamis.
Os modelos apontam para uma diminuição da adequabilidade do habitat nas regiões equatoriais, acompanhada por um aumento relativo nas zonas temperadas. Esta tendência poderá afetar áreas de desova e zonas tradicionais de pesca, com potenciais implicações ecológicas e socioeconómicas, sobretudo para comunidades dependentes da pesca destas espécies em países tropicais. De acordo com os autores, este padrão representa um risco de redução drástica da área de ocorrência, ou mesmo extinção local dos atuns em regiões equatoriais. O estudo antecipa que esta mudança na distribuição dos atuns para latitudes mais altas poderá começar já em 2030, acompanhada por fortes perdas de habitat nas zonas tropicais, o que coloca em causa a presença contínua destas espécies em áreas onde hoje são abundantes.
Sendo um dos produtos do mar mais procurados para consumo humano, alterações na distribuição das principais espécies de atum podem vir a afetar não só a sua disponibilidade para as frotas pesqueiras, mas também a oferta no mercado global. "Os atuns estão entre os recursos marinhos mais valiosos e mais populares em todo o mundo, comercializados à escala global”, recordam os autores no artigo. As implicações poderão ser especialmente relevantes para as populações e economias que dependem fortemente da pesca de atum.
“Este tipo de projeções é essencial para antecipar mudanças e apoiar a gestão adaptativa das pescas”, explica Priscila Silva, investigadora do MARE-ULisboa/ARNET e primeira autora do estudo, citada no comunicado.
A investigação destaca a importância da temperatura de superfície do oceano, do oxigénio dissolvido e da salinidade como os principais fatores ambientais a influenciar a distribuição futura dos atuns. O estudo reforça também a necessidade de considerar as dinâmicas ecológicas e ambientais nos processos de tomada de decisão relacionados com a sustentabilidade das pescas.
“Os resultados mostram que a distribuição dos atuns pode mudar substancialmente nas próximas décadas, o que levanta desafios importantes para a gestão das pescas. Integrar cenários climáticos na tomada de decisão poderá ser fundamental para garantir a resiliência dos ecossistemas marinhos e das comunidades que deles dependem”, afirma Francisco Borges, também autor do estudo e investigador do MARE-ULisboa/ARNET.
Tendo em conta a importância socioeconómica das espécies de atum, os autores defendem que prever a sua resposta às alterações climáticas é essencial para informar estratégias de gestão mais eficazes, não só para a sustentabilidade das populações marinhas, mas também para proteger os meios de subsistência das comunidades humanas que delas dependem.
Este trabalho foi financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), através dos projetos atribuídos ao MARE/ARNET e CESAM, e contou com o apoio do European Research Council.
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