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Revista TecnoAlimentar

Qual o impacte ambiental do nosso prato de comida?

Por: Carmen Lima, da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza

laranjas

Na grande maioria das vezes, quando compramos os nossos alimentos ou confecionamos uma refeição, não nos passa pela cabeça o impacte ambiental associado aos produtos que vamos ingerir.

No entanto, por detrás de um belo prato de “cozido à portuguesa”, ou de qualquer outra escolha gastronómica que possamos preparar para nos alimentar, há todo um circuito envolvendo diversos parceiros, com consumo de recursos e emissões associadas, ou seja com um impacte ambiental inerente.

As questões ambientais são uma das principais preocupações do século XXI, pelo que a procura por soluções que minimizem este problema ganha cada vez mais a atenção de governos, industriais, empresas, associações e sociedade civil, porque pequenos gestos podem contribuir verdadeiramente para uma grande diferença.

A origem dos nossos alimentos

As nossas escolhas alimentares, para além de interferirem diretamente com a nossa saúde, interferem com o equilíbrio ambiental, dado que são responsáveis por efeitos diretos e indiretos, como o consumo de recursos, perda de biodiversidade e contribuem inevitavelmente para as alterações climáticas.

Ao compramos alimentos muitas vezes não sabemos o que está por detrás da sua produção. Muitos de nós não questiona se o produto disponível é sazonal, se provém do território nacional ou é importado (com movimentações e deslocações durante o processo de fabrico), se é transgénico ou de origem não controlada, se tem açucares adicionados ou outros componentes químicos para prolongar a vida útil do produto.

E se o produto for transgénico (organismo geneticamente modificado – OGM), podemos estar perante um risco para o ambiente e para a saúde, dado que estas espécies são desenvolvidas para serem resistentes aos herbicidas, logo para conseguir aniquilar todas as espécies que possam ser consideradas como invasoras, é necessário recorrer a uma quantidade superior do próprio herbicida, com os efeitos que esta medida possa ter na redução dramática da biodiversidade, com a morte dos insetos e de outra fauna essencial ou com a exterminação de plantas que fazem parte dos ecossistemas, alterando os equilíbrios, que provocam alterações nas variedades alimentares locais.

Na realidade muitos de nós analisa apenas um critério – o preço. Mas este preço na maioria das vezes não internaliza o custo ambiental real associado à sua produção. Conseguimos colocar produtos vindos do outro lado do Mundo a preços menores que os produzidos em Portugal, como é possível? O que parece tão óbvio por vezes não conseguimos enxergar, simples aspetos como olhar para a origem do produto e dar preferência a alimentos que não tenham que viajar quilómetros para chegar ao nosso prato.

Os impactes dos processos produtivos

Várias tem sido as personalidades que nos têm alertado para a necessidade de reduzirmos o consumo da proteína animal, porque o Planeta não vai resistir ao impacte associado à sua produção.

Está identificado que a produção de carne por exemplo, contribui em cerca de 18% para o aquecimento global, curiosamente mais do que o setor dos transportes cujo contributo é de 13,5%. Esta elevada contribuição é provocada pelo sistema digestivo dos ruminantes que atua como uma pequena fábrica de metano, um gás 20 vezes mais prejudicial para o Ambiente que o dióxido de carbono emitido pelos transportes e que é emitido sob a forma de estrume e flatulência, chegando a ser responsável pela emissão de 500 litros de metano por ano para a atmosfera.

Só em Portugal, com o número de cabeças de gado bovino existente, este valor poderá facilmente atingir os 750 milhões de litros por ano. Ora, esta informação é veiculada nos fóruns científicos, nos jornais da especialidade mas se perguntarmos diretamente a qualquer consumidor no acto da compra da carne se conhece o verdadeiro impacte do bife que vai comprar, provavelmente a resposta será “não”.

Várias soluções tem vindo a ser testadas para reduzir estas emissões, como por exemplo a introdução de uma mistura na ração composta por alfafa, linhaça e trevos, que contribuiu para reduzir 18% destas emissões, ou por outro lado a incorporação de 2% de algas na dieta alimentar destes animais, com resultados impressionantes na contribuição para a redução até 70% das emissões de metano.

Mas ainda não abordámos o consumo de água! Por exemplo, para produzir 1 kg de carne de vaca são necessários 15.000 litros de água, dos escassos 3% que temos disponíveis no Planeta. Mas os impactes não ficam por aqui, a indústria da agropecuária pode contribuir para a perda de biodiversidade, desflorestação e desertificação, assim como o uso de hormonas e medicamentos proporcionam efeitos nefastos na contaminação dos solos e dos lençóis freáticos.

Para termos ideia, o impacte ambiental associado a apenas 1 kg de bifes de vaca é equivalente à condução de um automóvel durante 250 km, utilizando combustíveis fósseis.

Por outro lado, se escolhermos alimentos provenientes de agricultura convencional, onde existe o recurso ao uso de pesticidas e fertilizantes químicos, com danos ao para os ecossistemas, pois matam os organismos fundamentais como os insetos de várias espécies, inclusivamente polinizadores como as abelhas, poluem o solo, o ar e a água, e acabam por entrar na cadeia alimentar a vários níveis. Também os fertilizantes químicos de síntese usados na agricultura convencional, as hormonas e medicamentos usados em larga escala na pecuária intensiva acabam por poluir o solo, os lençóis freáticos, as águas dos rios e mesmo os oceanos.

Pelo contrário, quando optamos por comprar produtos oriundos da agricultura biológica, sabemos que foram cumpridas regras de proteção ambiental e de bem estar animal. Na agricultura biológica não são permitidos pesticidas ou herbicidas químicos de síntese. Mesmo os pesticidas naturais só são usados em última instância, pois a saúde do solo e o equilíbrio do ecossistema são a base deste modo de cultivo. Além do mais, na agricultura e pecuária biológica, não são permitidos, de todo, alimentos ou produtos transgénicos.

(continua)

Nota: Artigo publicado na edição impressa da TecnoAlimentar 17, no âmbito do Dossier Embalagem na Indústria Alimentar.

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